No século XIX era muito comum, sobretudo em países afastados da fé, que pensadores – por influência das descobertas científicas recentes ou de teorias filosóficas – buscassem “refutar” a Bíblia.
Você poderia me dizer, que isso acontece até hoje. E é verdade. Embora as descobertas científicas e perspectivas filosóficas (autênticas) mais recentes tendam a ver com melhores olhos as Sagradas Escrituras, em certa “cultura popular” ainda permanece esse impulso – para dar algum nome – de querer “refutar” a Bíblia.
Eu comecei falando disso, porque, para os cristãos, entenderem aquele que é o seu livro capital demanda esforço. Se nos estranha que alguém, sem conhecer as Sagradas Escrituras, queira “refutá-las”, o que colocamos – da nossa parte – para entendê-las melhor?
Parece-me que um dos caminhos para que os próprios cristãos – e aqueles que desejam sinceramente conhecer o cristianismo – se aproximem da Bíblia é entender como ela foi formada. A partir da sua formação, de como esse processo aconteceu, poderemos entender melhor o que a Bíblia é.
A Bíblia manifesta uma relação entre Deus e os seres humanos, Suas criaturas. Ao se afastarem d’Ele pelo pecado original, os homens se diminuíram de tal modo que a proximidade com o Criador ficou mais e mais difícil. Então Ele mesmo decidiu estreitar a relação que, conforme o seu plano amoroso para nós, nunca deveria ter sido quebrada.
Por causa do pecado, a inteligência e a vontade humanas ficaram prejudicadas. Deus, mais uma vez, quis remediar a nossa debilidade. Inspirou as Escrituras Sagradas para que, apesar dos nossos pecados, pudéssemos conhecê-lO. Como disse São Paulo, na segunda epístola a Timóteo, “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para refutar, para corrigir, para educar na justiça a fim de que o homem de Deus seja perfeito, qualificado para toda boa obra”.
As Escrituras mostram o que o homem pecador, por sua própria conta, não consegue ver. Elas são mais uma prova do amor de Deus.
Deus se manifestou primeiro ao povo hebreu. Antes mesmo da Bíblia começar a ser escrita, ela aconteceu. A narrativa que recebemos consiste numa série de acontecimentos, de experiências do povo hebreu, com Deus, que buscou restabelecer o laço com as Suas criaturas. É natural, portanto, que a narrativa – posterior aos fatos – dê mais ênfase nas lições aprendidas do que nos fatos em si.
A primeira forma de transmitir tanto os fatos quanto as lições foi a da tradição oral. Lições e fatos estão ligados de tal modo, que os acontecimentos são como pequenos núcleos a partir dos quais se formaram cantos, poemas e discursos cujo objetivo era manter viva a aliança com Deus. A tradição oral relatava a memória, mas a memória de uma relação ainda presente. Por isso é comum vermos os mesmos relatos na Bíblia contados de maneiras diferentes.
Séculos depois do início da transmissão oral, as circunstâncias histórias e sociais demandaram registros escritos da tradição ainda conservada na memória e vida do povo hebreu. Lavrou-se por escrito o núcleo da tradição oral. Esse trabalho foi realizado por pessoas, mas com a inspiração do Espírito Santo. Essa é a seleção que conhecemos no Antigo Testamento.
Quanto ao Novo Testamento, especificamente, os cristãos já encontraram a tradição escrita anterior. Por esse motivo souberam, desde cedo, da necessidade de relatar – no caso dos Evangelhos, especificamente – os principais acontecimentos da vida de Cristo, enlaçados por sua vez com as narrativas do Antigo Testamento.
É interessante notar como a tradição oral ainda acompanhou a escrita. Podemos ver isso no Novo Testamento mesmo, na maneira como Cristo falou tanto aos apóstolos quanto às demais pessoas. Esse aspecto pessoal da tradição oral foi aproveitado também pelos evangelistas na sua maneira de descrever os episódios da vida de Nosso Senhor.
Consegue perceber, como a Bíblia não é um livro historiográfico, puramente filosófico e nem científico? Ela conta uma relação pessoal. Por isso, claro que várias áreas do conhecimento humano podem aparecer ao longo da narrativa, mas a nenhuma delas se reduz o conteúdo das Sagradas Escrituras.
Se você tiver em mente a maneira como a Bíblia foi formada, já terá dado mais um passo até ela.
Não se esqueça de que, em se tratando das Sagradas Escrituras, o estudo precisa sempre estar acompanhado da oração.
Até breve.
Victor.