A palavra coração aparece várias vezes na Bíblia, no Antigo como no Novo Testamento.
Nós a usamos com certa frequência. No nosso tempo, dar atenção ao coração parece significar conhecer os próprios sentimentos, as inclinações que temos. Claro que isso é uma redução do sentido original.
Mas note que eu disse redução. Isso significa que algo do sentido original da palavra, do sentido que encontramos na Bíblia, permanece. A redução está em que as nossas ações e motivações foram confundidas com inclinações e sentimentos. Estes passaram a ser entendidos como o centro da nossa identidade.
A relação entre coração e o centro mesmo do nosso ser não está errada. Essa é a parte do sentido original que ainda permanece. No entanto, a Bíblia está longe de reduzir o centro da pessoa aos seus sentimentos e inclinações.
No Salmo 119 lemos que “Eu te busco de todo o coração, não me deixes afastar de teus mandamentos”. É uma busca integral, que vai da raiz de quem é o salmista, que abarca os seus sentimentos e inclinações, mas que inclui também a inteligência e vontade. Ou seja, é o homem inteiro quem busca a Deus.
É a isso que Santo Agostinho se referiu quando disse que o nosso coração está inquieto enquanto não repousa em Deus. O Senhor é a fonte que rega e anima todo o ser. Quando o coração está voltado para Ele, então a pessoa inteira recebe a Água Viva capaz de saciar a sua sede.
As águas da fonte, no entanto, podem encontrar obstáculos para aquele que deveria ser o seu curso normal. Quando o coração está embotado (Isaías 6, 10) e endurecido (Isaías 46,12) ele fica pesado de tantos pecados e preocupações (Lucas, 21,34). Com o curso interrompido pelos detritos que formam uma verdadeira barragem, as águas da fonte não podem passar.
Os Padres do Deserto, diziam que a nossa vida espiritual é feita pelo próprio Deus. O nosso trabalho, a concentração dos nossos esforços, deveria estar em desobstruir o caminho para que a graça encha as nossas vidas. Pela imagem que estamos empregando neste e-mail, podemos dizer que precisamos romper as barragens que criamos a fim de que a água – que já vem da fonte – chegue até o nosso coração.
Como saber o que embota o seu coração? A Sagrada Escritura também nos indica o caminho.
“O homem bom, do bom tesouro do coração tira o que é bom, mas o mau, de seu mal tira o que é mal, porque a boca fala daquilo que está cheio o coração” (Lucas 6, 45).
As nossas palavras, revelam onde está o nosso tesouro e, portanto, onde está o nosso coração (Mateus 6, 21). Mas não só as palavras ditas. Os pensamentos também revelam o que levamos no coração; aqueles pensamentos que, conquanto não compartilhemos, vêm-nos à mente com maior frequência.
Se de dentro do coração – do centro de quem cada um de nós é – saem as intenções malignas (Mateus 7, 21), isso significa que o coração precisa ser renovado pelo contato com a Água Viva, desobstruído, desentumecido: “[...] removerei do seu corpo o coração de pedra, dar-lhe-ei um coração de carne, a fim de que andem de acordo com meus mandamentos” (Ezequiel 11, 19-20).
O processo de desobstrução, que conta com a nossa abertura, começa pela confissão de tudo o que sai do coração: as ações malignas e suas justificativas, os projetos perversos e até os pensamentos que nos assaltam quando menos esperamos.
Tendo consciência de tudo isso, você poderá saber onde está o seu coração. Se ele estiver num lugar que te pareça errado, não se preocupe. Você já terá dado o primeiro passo com o objetivo de ordená-lo.
Enquanto isso, nunca deixe de pedir: Jesus, manso e humilde de coração, fazei do meu coração semelhante ao vosso.
Depois desta nossa reflexão, você consegue perceber a profundidade dessa jaculatória.
Comece a ordenar o seu coração.
Até breve.
Victor.